segunda-feira, maio 11, 2009

Faust; C'est Com Com Complique

Os Faust estão no imaginário colectivo dos apreciadores do krautrock, ou do progressivo ou do avant-gard, ou como quiserem apelidar a música da formação germânica dos anos 70. Este colectivo caracterizou-se pela busca, e invenção sonora, a par de outras formações suas conterrâneas, como os CAN, os Kraftwerk, os Tangerine Dream, os Cluster, entre outros, sendo no entanto, na minha opinião, a que mais aprofundou o espírito experimental. Os Faust, são ainda hoje uma referência no panorama musical, sendo os quatro primeiros discos verdadeiras obras-primas. No final da década de 60, os Faust surgiram de uma geração de jovens alemães que fizeram renascer a produção cultural do país abalado por todas as questões relacionadas com o nacional-socialismo e todas as consequências que dai advieram. A nova geração de músicos foi muito influenciada pelo pioneirismo de Karlheinz Stockhausen e pelo movimento psicadélico britânico, tendo encontrado a ai a oportunidade de retomar um movimento criativo e experimental que foi interrompido pelo nazismo.

Agora, um novo disco. Coloca-se a pergunta inevitável, fará sentido, ainda, a existência dos Faust nos dias de hoje? Da formação original somente subsistem dois membros, o baterista Zappi W. Diermaier e o guitarrista Jean-Hervé Perón. Confesso que tinha muitas reticências sobre o novo trabalho muitas duvidas sobre a capacidade criativa destes velhos gurus e sobre se seriam capazes ao fim de este tempo conseguirem transgredir mais uma vez a linguagem do rock. Um facto é bem assente, este é o disco que mais vezes ouvi este ano, tendo descoberto sempre pequenos pormenores, ou provocações (explico mais adiante) em cada audição. Este é um daqueles disco que deve ser ouvido várias vezes e com “ouvidos de gente”. Por ventura esta música não seja tão transgressora como o foi nos anos 70, julgo mesmo que não terá sido a ideia principal dos seus criadores. Mas verdade seja dita, tendo em conta o panorama actual da música dita experimental, estes Faust sobressaem, e de que maneira. É bem verdade que o rock evoluiu e no espectro experimental existem nomes que fazem jus ao carácter destrutivo e revolucionário do género, como Wolf Eyes, NNCK, Keiji Haino, Matthew Bower, NWW, entre outros, mas os Faust não lhes ficam atrás, chegando mesmo a apontar (ou repontar) alguns caminhos. É usual afirmar que a idade é um posto, e neste caso isso é bem verdade, pois a experiencia musical permite evitar os clichés por eles próprios criados, mantendo contudo a veia provocadora e burlesco que a banda sempre cultivou. Os sons vocais (julgo que não se pode afirmar que eles cantam!), sempre falados, representam um desinteresse total pelas convenções musicais. Temas como Stimmen, com vozes e grunhidos levados ao estremo e Petits Son Appétissants, uma bela provocação com o formato tradicional da “chanson française”, marcam bem a intenção pretendida. É no entanto com C’est Com Com Complique, a faixa titulo, que os Faust actuais mais se aproximam dos Faust de há trinta e tal anos. Ai encontramos a irreverência e a amálgama de estilos que eram os Faust, do free jaz à música concreta. Nessa faixa eles atingem a música sem amarras, livre dos formalismos canónicos que abundam no éter. Se tudo o resto não fosse por si só para poder afirmar que estamos perante um dos grandes discos de 2009, este tema eleva este álbum para um dos fundamentais dos últimos anos, diria mesmo da década. Já lá diz o ditado, que velhos são os trapos, e é bem verdade, pois estes senhores que já não vão para novos, ainda dão cartas e dão mostras do que é ser verdadeiramente criativo e provocador, próprio de um espírito jovem. E quanto à pergunta colocada em cima, sim, ainda faz sentido a existência destes Faust e que vivam muitos e bons anos com esta irreverência…
Ponto de escuta:
C'est Com Com Complique

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